D. João V
- D. João V representa o poder real absolutista que condena uma nação a servir a sua religiosidade fanática e a sua vaidade.
- Cumpridor dos seus deveres de marido e de rei, D. João V assume apenas o papel gerativo de um filho e de um convento, numa dimensão procriadora, da qual a intimidade e o amor se encontram ausentes.
- Amante dos prazeres humanos, a figura real é construída através do olhar crítico do narrador, de forma multifacetada:
- é o devoto fanático que submete um país inteiro ao cumprimento de uma promessa pessoal (a construção do convento, de modo a garantir a sucessão) e que assiste aos autos-de-fé;
- É o marido que não evidencia qualquer sentimento amoroso pela rainha, apresentando nesta relação uma faceta quase animalesca, enfatizado pela utilização de vocábulos que remetem para esta ideia (como a forma verbal" emperenhou" e o adjectivo "cobridor");
- É o megalómano que desvia as riquezas nacionais para manter uma corte dominado pelo luxo, pela corrupção e pelo excesso;
- É o rei vaidoso que se equipara o Deus nas suas relações com as religiosas; é o curioso que se interessa pelas invenções do padre Bartolomeu de Gusmão;
- é o homem que teme a morte e que antecipa a sua imortalidade, através da sagração do convento no dia do seu quadragésimo primeiro aniversário.
D.Maria Ana Josefa de Áustria
D.Maria Ana, arquiduquesa de Áustria, era filha do Sacro Imperador Germânico, Leopoldo I, da Casa dos Habsburgos, e da sua terceira mulher, a condessa Palatina de Neuburgo Leonor Madalena. Foi rainha consorte de Portugal de 1708 a 1750, enquanto mulher do Rei D. João V de Portugal. Três dos seus filhos sentaram-se no trono: D. José, Rei de Portugal, D. Pedro, Rei-Consorte de Portugal pelo seu casamento com a sua sobrinha, e D. Maria Bárbara, Rainha de Espanha pelo casamento.
-O casamento com D. João V foi negociado em 1708. Os dois noivos eram primos direitos, por serem irmãs a Rainha D. Maria Sofia de Portugal e a Imperatriz Leonor Madalena, respectivas mães de Sua Majestade o Rei de Portugal e da Sereníssima Arquiduquesa da Áustria.
-Procurava-se com o casamento uma aproximação aos outros membros da Grande Aliança.
-A Rainha-mãe morreu no Palácio de Belém, a 14 de Agosto de 1754. D. Maria Ana foi enterrada no Mosteiro de S. João Nepomuceno, dos Carmelitas Descalços Alemães, por ela fundado. De acordo com o testamento, o coração foi levado para Viena e guardado lá na cripta imperial.
Baltasar Sete-Sóis
Baltasar Mateus é um dos membros do casal protagonista da narrativa. Representa a critica do narrador à desumanidade da guerra, uma vez que participa na Guerra da Sucessão e, depois de perder a mão esquerda, é excluído do exército.
Baltasar Sete-Sóis é um homem pragmático e simples, que assume o papel de criador na construção da passarola (ao realizar o sonho de Bartolomeu de Gusmão). Participa na construção do convento e partilha, através do silêncio, a vida de Blimunda Sete-Luas. Sucumbe às mãos da Inquisição.
Blimunda Sete-Luas
Blimunda de Jesus é uma jovem mulher do povo de dezanove anos que tem a capacidade de ver por dentro as pessoas e os objectos, durante o jejum, e de recolher as vontades.
O nome Blimunda é o reverso do de Baltasar, tal como é a Lua o reverso do Sol, que, juntamente com o número sete, completam-se até serem um só.
Blimunda tem uma grande firmeza interior e para além do dom de ver por dentro e de recolher vontades, tem um poder excepcional de intuição e de compreensão da complexidade do mundo.
Representa também o transcendente e a inquietação constante do ser humano em relação
à morte, ao amor, ao pecado e à existência de Deus.
Foi a única sobrevivente da Santíssima Trindade terrena, sendo à partida a mais
provável vítima da Inquisição devido aos seus dons.
- Blimunda é uma mulher sensual e inteligente, sem regras que a condicionem e escravizem.
- Dotada de poderes invulgares (como a mãe) escolhe Baltasar para partilhar a sua vida, numa existência de amor pleno, de liberdade, sem compromissos e sem culpa.
- O seu dom particular aproxima-a da espiritualidade da música de Scarlatti e do sonho de Bartolomeu de Gusmão.
- Blimunda transgride os códigos existentes e percepciona a hipocrisia e a mentira.
Padre Bartolomeu de Gusmão
O Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão representa as novas ideias que causavam estranheza na inculta sociedade portuguesa. Estrangeirado Bartolomeu de Gusmão torna-se um alvo apetecível da chacota da corte e da Inquisição, apesar da protecção real.
Homem curioso e grande orador sacro evidencia ao longo da obra, uma profunda crise de fé a que as leituras diversificadas e a postura “anti-dogmática” não serão alheias, numa busca incessante de saber.
A sua personagem risível (era conhecido por “Voador”) torna-o elemento catalisador do voo da passarola, conjuntamente com Baltasar e Blimunda. A tríade, corporiza o sonho e o empenho tornados realidade, a par da desgraça, também ela, partilhada (loucura e morte de Bartolomeu de Gusmão, morte de Baltasar Sete-Sóis no auto-de-fé e solidão de Blimunda).
Giuseppe Domenico Scarlatti
Giuseppe Domenico Scarlatti nasceu em Nápoles, a 26 de outubro de 1685. Seu pai, Allessandro Scarlatti, então com 25 anos e com seis filhos, já se firmara como compositor fecundo e rapidamente se aproximava da fama como operista.
- No final de 1713, por influência do pai, Scarlatti assumiu o posto de director musical da Basílica de São Pedro, no Vaticano. Permanecendo aí até 1719, onde escreveu muitas missas e algumas óperas, partituras que se perderam na maioria, com o tempo.
- Em 1720 o compositor foi para Portugal, tendo aí ficado por vários anos. D. João V, o soberano português,que mantinha uma das mais ricas cortes de todo o mundo, deu ao compositor todas as condições para que o seu trabalho fosse o mais rico possível.
-Scarlatti além de ser o director musical e compositor da corte, tornou-se professor de cravo da princesa Maria Bárbara. Que por sua vez, se tornou uma hábil intérprete e ligou-se ao compositor por toda sua vida.
- Mais tarde casando-se com o herdeiro do trono espanhol, em Janeiro de 1729, fez absoluta questão de levar Scarlatti para Madrid.
Clero
Revestidos pelas críticas do narrador, são enfatizados a sua hipocrisia e a sua violência de todos os seus representantes, com foco na Inquisição. Retratados por quebrarem constantemente a castidade e por desprezarem os pobre, é revelada a sua religiosidade vazia, cujos rituais originam a corrupção e a degradação moral no povo, ao invés de elevar os seus espíritos.
Povo
- O verdadeiro protagonista de Memorial do Convento é o povo trabalhador. Espoliado, rude e violento tipificam a massa colectiva e anónima que construiu, de facto, o convento.
- A crítica e o olhar mordaz do narrador enfatizam a escravidão a que foram sujeitos quarenta mil portugueses, para alimentar o sonho de um rei.
- A necessidade de individualizar personagens que representam a força motriz que erigiu o palácio-convento, sob um regime opressivo, traduz a essência de ser português:
- GRANDES FEITOS, COM GRANDE ESFORÇO E CAPACIDADE DE SOFRIMENTO.